Leitura e sucesso escolar
por Sandra Kezen
Ano III n.42 fevereiro de 2004 como www.partes.com.br/ed42/educacao1.asp
As novas práticas de ensino têm muito a enriquecer o dia-a-dia da escola. Por exemplo, sabemos hoje que o aluno tem um conhecimento prévio da língua, produto de suas experiências e vivências, conhecimento esse que pode, efetivamente, contribuir com a leitura e o entendimento de textos. Cabe a nós, professores de língua, ativarmos e explorarmos todas as possibilidades que o aluno tem de interagir com o texto.
Quando sabe que será ouvido, o aluno sente que faz parte do processo educativo e é muito mais fácil motivá-lo dessa maneira: fazendo dele nosso interlocutor, trocando ideias de verdade. Este já deveria ser um hábito rotineiro do professor, que é também um aprendiz em sua prática diária. O afeto é uma das melhores formas de chegarmos a um bom resultado. Palavras de encorajamento e de apoio só fazem melhorar o desempenho de nossos alunos.
A relação leitura-escrita
Na década de 80, muitos pesquisadores chegaram à conclusão de que leitura e escrita têm importantes relações uma com a outra: como habilidades, como processos cognitivos, como maneiras de aprender. Os pesquisadores destacaram a alta correlação entre bons escritores e bons leitores e viam a leitura e a escrita como um processo interativo. Notaram que melhores escritores liam mais, melhores leitores escreviam prosa mais sintaticamente madura e as experiências com leitura melhoravam a escrita mais que a instrução gramatical ou exercícios de escrita. Portanto, parece óbvio que aprendemos a ler, lendo e a escrever, escrevendo. E qual seria o lugar mais adequado para estas duas práticas ? A sala de aula, naturalmente. O linguista Sírio Possenti, em seu livro Por que (não) ensinar gramática na escola, afirma que “ler e escrever não são tarefas extras que possam ser sugeridas aos alunos como lição de casa e atitude de vida, mas atividades essenciais ao ensino da língua. Portanto, seu lugar privilegiado, embora não exclusivo, é a própria sala de aula”.
Mudança de atitude
Na verdade, a mudança tem que partir do profissional de ensino : ele é o elemento mais capaz de desencadear este processo. Um dos grandes problemas da educação é exatamente a postura do professor: ele está tão acostumado a questionar o desempenho do aluno que esquece-se de refletir sobre o próprio. Os professores de língua (dos quais faço parte) listam inúmeras razões para o fraco desempenho dos alunos: não sabem e não querem ler, não sabem escrever um texto, não entendem o enunciado das questões, não sabem as regras de concordância, estão piores a cada dia, blá-blá-blá. E nós, professores, o que fazemos para melhorar ? Lemos constantemente? Escrevemos com frequência? Estudamos com afinco? Criamos novas maneiras de apresentar os mesmos velhos conteúdos ? Incentivamos a leitura em sala de aula ? Ou insistimos na postura tradicional de ensinar regras de gramática ? Usamos de nossa « autoridade » para fazermo-nos « obedecidos » ? Fazemos « terrorrismo » porque as « provas » estão próximas ? Cabe aqui uma reflexão sincera e profunda de nós mesmos e de nossas práticas « educativas ».
Facilitando o acesso à leitura
Os professores devem investir na funcionalidade da leitura. Ainda mais quando o aluno provém de classes menos favorecidas economicamente e não tem acesso fácil ou nenhum a livros ou a textos escritos, nosso papel é oferecer a maior diversidade possível de textos: quadrinhos, revistas, jornais, anúncios, bilhetes, cartas, rótulos, bulas, cartazes, avisos, classificados, poemas, contos, charges, etc. Com isso, estaremos facilitando o acesso desse aluno ao mundo da leitura. O hábito da leitura dispensa a sistematização do ensino de regras gramaticais e faz o aluno depreendê-las do contexto de maneira mais agradável. Penso que devemos também fazer um estudo da língua com um todo, e não fragmentar a língua em gramática, literatura e redação. E contudo, o envolvimento do professor é a base desse processo: com isso, certamente os resultados serão melhores.
Equívocos no ensino de língua
É claro que todo professor deseja que seus alunos escrevam corretamente. Com certeza todos acham que devem ensinar a norma culta. Quem tem a ganhar com isso? Certamente o aluno de classes sociais mais altas, que já a praticam em seus ambientes familiares. A eles nada está sendo imposto: a língua que a escola propõe como ideal é a mesma que eles usam em casa. E os outros alunos? Aqueles que frequentam as escolas públicas porque não podem pagar o ensino numa escola particular? Aqueles que não usam a norma culta em seu dia-a-dia? Esses pobres alunos irão sofrer. Ao se depararem com o ensino tradicional da norma culta, eles terão um choque: aquele parece-lhes um outro idioma, tão diferente que é da sua língua. Além disso, enfrentarão preconceitos do tipo « eles vêm de ambientes linguisticamente pobres e por isso nunca conseguirão aprender português » e é comum ouvirem que a norma culta é a única que se deve respeitar. Pior ainda é quando são rotulados de « fraquinhos », « burrinhos », e outros adjetivos pejorativos que expressam claramente a rejeição que enfrentam. Frequentemente, intimidados, irão reproduzir o comportamento esperado : continuarão « fraquinhos » porque não terão chances de mudar.
Estratégias de leitura
Como fazer da leitura uma atividade prazeirosa? Afeto, atenção e comprometimento são fundamentais para a nossa prática. Utilizando as estratégias de leitura, o caminho torna-se mais fácil. O uso dos novos métodos pode fazer de nossas aulas atividades mais interessantes, lúdicas e pode fazer nossos alunos aprenderem a língua com mais facilidade, já que vão interagir com os textos trabalhados. Acredito que a leitura possibilita ao aluno estruturar seu vocabulário com maior desenvoltura, com coesão e coerência. Aulas motivadoras, alunos envolvidos e bons resultados. Quem sabe esse seria um caminho a facilitar as nossas (de professores e alunos) vidas ?
Os procedimentos de análise de textos segundo as estratégias, sugestões para preparo de material didático e técnicas sobre esta abordagem em sala de aula estão disponíveis para quaisquer pessoas interessadas