Ecoturismo sem planejamento é propaganda enganosa
por Giuliana Capello
Revista Partes ano II – fevereiro de 2003 – n.30 www.partes.com.br/ed30/socioambiental.asp
De repente, aquele vilarejo de 50 famílias, sem luz elétrica, de acesso por barco ou trilha de 6km pela mata primária se transforma – da noite para o dia – no mais novo destino oferecido por operadoras de turismo com sede a, pelo menos, 3.000 km dali, e que vendem 7 dias num pedaço do paraíso, com todos os luxos das grandes metrópoles, numa embalagem de ecoturismo.
O local realmente tem tudo para estampar belíssimas praias na capa da revista lida por pessoas que têm muito dinheiro para gastar em viagens, mas já se cansaram das catedrais francesas, das gôndolas de Veneza e, quem sabe, até das compras em Nova York.
O problema é um só, o DE REPENTE, fruto da pressa e da ânsia pelo lucro, que costumam atropelar etapas fundamentais para a implantação de qualquer programa de ecoturismo, seja ele onde for. Planejamento e participação da comunidade local. Sem esses elementos, o tiro da boa intenção (e da visão de mercado) daqueles que pretendem atrair turistas pela via da conservação ambiental pode sair pela culatra e destruir, em pouco tempo, toda a “matéria-prima” do negócio: os atrativos naturais e a cultura local.
Estudos do WWF mostram que, embora o ecoturismo seja o segmento da indústria do turismo que mais cresce anualmente (entre 10 e 30%), a maior parte dos empreendimentos que movimentam essa mina de ouro é, na verdade, insustentável, ou seja, foge da ideia central do ecoturismo, idealizado por ambientalistas e amantes de cachoeiras inóspitas: o uso sustentável dos recursos naturais, que deve ser conquistado por meio de estratégias como pequena escala, baixa densidade, informação, educação ambiental, respeito e troca de conhecimentos com a comunidade local, sua cultura e sua maneira de se relacionar com a terra.
Para que um projeto de ecoturismo tenha sucesso, ele precisa envolver pessoas capazes de olhar para o alvo de suas ambições econômicas, políticas e empresariais com novos valores, sob uma perspectiva mais holística, na qual a boa administração dos recursos e a manutenção das tradições locais sejam suas jazidas de petróleo.
No Parque Nacional Amboseli, no continente africano, por exemplo, um levantamento constatou que um único leão, como atração turística, é capaz de gerar US$ 27.000 por ano. Já uma manada de elefantes foi avaliada em US$ 610.000, o que mostra que os animais valem muito mais vivos do que mortos. Uma mesma comparação de valores, se usada no Brasil, certamente colocaria o país no topo do ranking das nações mais ricas do mundo.
Tão valiosos quanto a fauna são a nossa flora e nossa riqueza cultural, que não devem ser ou estar subordinadas a nenhum investidor hoteleiro, dono de madeireira ou prefeito oportunista, louco para abocanhar milhões em impostos sem qualquer preocupação com o “day after” de seu mandato.
O grande desafio está em conciliar interesses, à primeira vista, bastante distintos. Políticos, a indústria do turismo, ONGs ambientalistas, candidatos a ecoturistas e a população local têm nessa história direitos e deveres próprios e específicos. Se você está entre uma dessas categorias, preste atenção nas palavras sábias dos indígenas: “O Turismo é como o fogo: pode cozinhar sua comida ou destruir sua casa”.
*para quem quiser mais informações sobre o assunto, vale a pena a leitura do livro “Ecoturismo: impactos, potencialidades e possibilidades” (Ed. Manole), de Stephen Wearing e John Neil.