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Censura?

Censura? 

como www.partes.com.br/imprensa09,html  Ano I – Nº9 – dezembro de 2000

Luiz Antonio Magalhães

Ao mesmo tempo em que começo a escrever este texto, surgem na internet as primeiras fotos do almoço do presidente da República com os atores que estão trabalhando na telenovela “Laços de Família”, veiculada pela Rede Globo de Televisão.

Já faz mais de uma semana que a telenovela virou uma novela à parte, com enredo ainda mais picaresco e emocionante do que o original. Tudo começou com a decisão do juiz Siro Darlan, que obrigou a emissora a iniciar a exibição de “Laços de Família” às 21 horas e a retirar os menores de 18 anos da novela, devido às cenas de conotação sexual presentes na trama. A verdade é que o país se encontra dividido em torno da polêmica da hora: a poderosa Rede Globo está sendo censurada?

Desnecessário dizer que a idéia de censura foi levantada pela própria Vênus Platinada, obstinada em manter a novela no horário das 20h30 e em contar com as crianças que atuam no elenco do programa. Em uma sociedade democrática, aliás, deve ser assegurado o direito da emissora de tentar convencer a opinião pública da correção de seus atos.

Até aqui, portanto, nenhum problema: o juiz julgou, a decisão foi publicada, a emissora tem de cumprir, mas pode tentar se defender.

O que causa enorme espanto é o poder de convencimento da Rede Globo. Nem bem a emissora carioca iniciou a sua cruzada contra a “censura” e começaram a aparecer, de todos os cantos, os apoios. A solidariedade veio de artistas, intelectuais e políticos de vários matizes, inclusive gente que se diz “de esquerda”.

Não vou discutir aqui o mérito da sentença do juiz Darlan. O mais importante é assinalar que não há a mais remota possibilidade de estar ocorrendo censura à Rede Globo. O juiz está respaldado pela Constituição Federal e pelo ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente), a emissora pode recorrer às instâncias superiores da Justiça Brasileira. Em outras palavras, tudo ocorre dentro da normalidade.

Os seres de esquerda que abraçaram a tese da censura, porém, argumentam que o caso “abre precedentes” para o recrudescimento do autoritarismo. Estultice. O dia em que o Judiciário – e, portanto, a sociedade representada neste Poder – não puder julgar o horário em que certas cenas devem ir ao ar e for obrigado a curvar-se aos desejos de um determinado órgão de comunicação, aí sim estaremos vivendo o recrudescimento do autoritarismo. Será a ditadura da mídia, dos grandes grupos que controlam a comunicação social no país.

Na verdade, o “precedente aberto” é bem outro. Com rara felicidade, o editorial publicado na última terça-feira no “Estado de S. Paulo” revela o que está em jogo: “o juiz da 1ª Vara da Infância e da Juventude do Rio de Janeiro, Siro Darlan, abriu um precedente importante: a maior e mais poderosa rede de televisão do país foi obrigada a cumprir as determinações da legislação vigente.”

Não deixa de ser interessante notar, por fim, que o “poder de convencimento” da Rede Globo também atinge em cheio a chamada “grande imprensa” escrita. Com exceção do “Estado de S. Paulo” e do “Jornal do Brasil”, praticamente todos os demais apoiaram a emissora ou evitaram posicionar-se no debate, limitando-se a noticiar a guerra das liminares.

E resta agora saber se a atriz Vera Fischer conseguiu, durante o almoço, convencer o presidente Fernando Henrique Cardoso a interceder contra a “censura” à Rede Globo. O Brasil é mesmo uma novela…

Luiz Antonio C. C. Magalhães é editor-assistente do Observatório da Imprensa

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