Fátima Teixeira
Você tem um idoso em sua família?
Qual o grau de convivência e responsabilidade presente na relação entre você e esse idoso?
Neste artigo vamos procurar abordar a questão do idoso dentro do âmbito familiar sobre dois enfoques. De um lado, o ponto de vista do idoso com suas necessidades e expectativas e do outro a família moderna com sua organização e dinâmica nem sempre entendendo o processo que o idoso vem experimentando nessa etapa da vida.
A família é definida como um grupo enraizado numa sociedade e tem uma trajetória que lhe delega responsabilidades sociais. Especialmente perante o idoso, a família vem assumindo um papel importante e inovador, na medida em que o envelhecimento acelerado da população que estamos constatando é um processo recente e ainda pouco estudado pelas ciências sociais.
A Constituição Federal de 1988, apresenta a família como base da sociedade e coloca como dever da família, da sociedade e do Estado “amparar as pessoas idosas assegurando sua participação na comunidade, defendendo sua dignidade e bem estar e garantindo-lhes o direito à vida”.
Neste sentido, cabe aos membros da família entender essa pessoa em seu processo de vida, de transformações, conhecer suas fragilidades, modificando sua visão e atitude sobre a velhice e colaborar para que o idoso mantenha sua posição junto ao grupo familiar e a sociedade.
Aqui cabe uma primeira indagação: Como os filhos, de uma maneira geral acostumados a serem cuidados e dependentes dos pais por bons anos de suas vidas, num dado momento passam a experimentar uma inversão nessas relações quando os pais começam a necessitar de atenção e ajuda?
Com as fragilidades que muitas vezes acompanham o processo de envelhecimento é comum surgirem conflitos entre os filhos quando a situação dos pais passa a lhes exigir novas responsabilidades e cuidados. O filme “Parente é Serpente” de Mário Monicelli, 1993, Itália, aborda, entre outros aspectos, essa problemática quando a mãe, percebendo suas limitações físicas e senilidade do marido, delega aos filhos a decisão pelo futuro do casal.
Na realidade, a família precisa de um período de adaptação para aceitar e administrar com serenidade a nova situação, de forma a respeitar as necessidades dos pais e evitar que se sintam um encargo para os filhos. Daí a importância do idoso concentrar esforços para , nos mais diversos sentidos, não se entregar à inatividade evitando o mais possível o sentimento de dependência da família que tanto aflige o idoso.
Percebemos, em nossa experiência prática , que os idosos carregam a expectativa de receberem atenção e cuidados dos filhos e netos no momento em que perderem ou tiverem suas capacidades diminuídas, sendo este um fantasma constante a perseguir e preocupar os mais velhos.
Outra questão importante diz respeito à conjuntura atual, cujo desemprego estrutural vem colocando à margem do processo produtivo significativo número da chamada população economicamente ativa. Os idosos, ainda que empobrecidos, tiveram a oportunidade de viver uma fase anterior na qual havia trabalho em abundância e salário suficiente para sustentar sua família, adquirir a casa própria e o direito à aposentadoria. Observamos que em alguns casos de separação conjugal ou desemprego os filhos retornam à casa dos pais em busca de apoio. Eles se constituem para os filhos numa retaguarda e acolhimento em momentos de necessidade e se estabelecendo na família uma relação de dependência material e afetiva.
A dependência entre as gerações, no nosso entender, se revela de duas naturezas distintas: de um lado a dependência material dos filhos que por precisarem cada vez mais e por mais tempo da proteção dos pais, não hesitam em aceitá-la, até por entenderem como obrigação. Do outro lado a dependência emocional dos pais, fruto do modelo familiar estabelecido. Neste modelo a família é entendida como uma forma natural de organização da vida coletiva, uma instituição estável da sociedade, sendo a união entre seus membros a principal responsável pela integração e harmonia da vida familiar.
Essa dependência se caracteriza, no nosso ponto de vista, num verdadeiro acordo tácito, ou seja, uma negociação na qual os pais acalentam a expectativa de obter no momento que necessitarem a retribuição pela dedicação oferecida à família.
As mudanças que estão ocorrendo nas representações de família nas novas gerações estão exigindo formas alternativas de convívio familiar e conseqüentemente a reformulação de valores e de conceitos.
A família brasileira do terceiro milênio está cada vez mais distanciada do modelo tradicional, no qual o idoso ocupava lugar de destaque. Estamos vivendo um importante período de transição e mudanças, no qual se faz necessário o entendimento das transformações sociais e culturais que vem se processando nas últimas décadas, para enfrentarmos o nosso próprio processo de envelhecimento dentro de expectativas condizentes com as novas formas de organização familiar. No entanto, qualquer que seja a estrutura na qual se organizará a família do futuro, há a necessidade de se manterem os vínculos afetivos entre seus membros e os idosos. Nesta fase da vida, o que o idoso necessita é sentir-se valorizado, viver com dignidade, tranquilidade e receber a atenção e o carinho da família.
Fátima Teixeira é assistente social