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O Brasil Privatizado II

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O Brasil Privatizado II
O assalto das privatizações continua
Autor: Aloysio Biondi
R$ 7,00 – 64 páginas

Prefácio
A publicação de O Brasil Privatizado II: O assalto das privatizações continua poderia ser justificada de várias formas. A mais imediata seria simplesmente dizer: “O Aloysio já havia acertado com a Editora Fundação Perseu Abramo uma continuação do primeiro. Além disso, ele até já preparara um roteiro, apontando os temas que seriam abordados, e estava pronto para começar o trabalho” – o que é verdade.
Poderíamos também lembrar que o tema continua a ser de importância fundamental na discussão da política econômica, dos rumos e do futuro do país. Embora muita coisa tenha mudado após O Brasil Privatizado – Um balanço do desmonte do Estado, publicado em abril de 1999, várias distorções no processo de privatização foram mantidas. O favorecimento a grupos específicos; a utilização de recursos do BNDES; os prejuízos que o governo, “o povão, a classe média, os agricultores”, como dizia Biondi, tinham com o “saneamento” das empresas que eram privatizadas; a importação maciça de
peças por parte das multinacionais que “compravam” as estatais; as remessas de lucro para o exterior. Todas essas características do processo, que se mantiveram praticamente inalteradas, e que, neste segundo livro, o autor pretendia discutir mais especificamente com relação ao setor energético – sobretudo no que diz respeito ao petróleo – e aos bancos estatais.
A necessidade da publicação, seja do ponto de vista profissional, seja sob a ótica da pertinência do assunto, não justificaria de todo, porém, que esse volume chegasse a público.
Além de continuação do primeiro trabalho, O Brasil Privatizado II tem como principal justificativa realizar uma homenagem a Biondi. Homenagem essa em parte bastante difícil, pela qualidade e quantidade de artigos que ele escrevera sobre o tema após o livro inicial. Pela ausência do jornalista, amigo e pai. Pela dificuldade em se trabalhar sem ele e, ao mesmo tempo, tentar pensar um pouco como ele, imaginar como ele gostaria que o livro fosse, que tabelas montaria, como analisaria os dados, como relacionaria as informações. Não nos demos o direito de fazer tais análises, sabíamo-nos
incapazes. Haveria, aliás, alguém capaz de realizar esse trabalho como ele?

Contentamo-nos em fazer uma coletânea de artigos sobre o tema, mas entendemos que a homenagem não seria plena se não trouxesse textos do autor que revelassem mais sobre sua relação com o Brasil, com nosso povo, com a vida. Que revelassem algo mais sobre quem era Aloysio Biondi. O livro tem também um pouco essa função, sobretudo sua primeira parte. Mostra muito do sonho que Biondi nutria em relação ao país – o sonho sempre presente nas palavras do mestre Celso Furtado – e que se revelava em cada artigo de Aloysio, em cada ação, em cada gesto.
Mostrava-se nas mais de 14 horas, 16 horas que chegava a trabalhar diariamente. Na alimentação, ora leve, regrada, como um caldo de fubá – para não causar moleza e diminuir o ritmo frenético de trabalho – ora nem tão regrada, como um cachorro-quente na rua – para conciliar com a pressa, a dificuldade financeira ou a desorganização passageira. Tudo isso está presente, e escondido, em cada artigo do livro.

Artigos também nascidos, por exemplo, da constatação do descaso do governo com os bancos estatais, revelado até no tamanho das filas que se avolumavam em diversas agências do Banco do Brasil. Textos surgidos a partir dos pedágios que brotavam nas rodovias privatizadas entre Campinas e Aguaí, em São Paulo, e que ele tinha de enfrentar toda vez que ia a São José do Rio Pardo, sua cidade de criação. Junto com as estradas – onde nem sinal das melhorias prometidas se via – Biondi indignava-se com a cebola despejada na beira da estrada: “Descaso do governo com o agricultor”.
Aloysio viajava pelo país quase sempre por terra não só pelo medo que nutria por voar. Muitas vezes, seus longos “passeios” de ônibus justificavam-se de forma mais forte. Em certas ocasiões, era o único momento que possuía para ler seus jornais, atualizar sua leitura, seus dados, seus inseparáveis recortes. Sem suas leituras cotidianas e sem essa atualização, seria impossível Biondi apontar, com tanta antecedência, a importância que o petróleo desempenharia no atual momento da economia mundial. Seria impossível explicitar também a importância dos poços descobertos pela Petrobrás na Bacia de Campos. Sem seus recortes sobre o assunto, contaria somente com uma preocupação antiga, surgida de suas leituras de Monteiro Lobato.

Todos esses artigos, todas essas questões, só serão capazes, porém, de explicar em parte quem foi Aloysio Biondi. Sua indignação, sempre lembrada, é insubstituível, única. Assim como é impossível explicar sua essência, que era a alegria com que vivia e que foi, muitas vezes, esquecida por aqueles que dele lembravam.
Sua força, sua alegria de viver, sua capacidade de procurar ver as coisas por um lado positivo, de buscar enxergar perspectivas, jamais poderão ser entendidas na plenitude sem sua presença. Além da leitura do livro que aqui apresentamos, lembrando de tudo o que Biondi foi e será, cumpre a nós, agora, cobrir parte do vazio deixado. Reconhecer sua ausência e torná-lo presente por meio de toda essa força que ele nos deixou. Daqui para frente, a melhor forma de dar continuidade a seu trabalho, a sua força, será sermos todos um pouco Aloysios. Tarefa difícil, mas fundamental.

Antônio Biondi
Setembro de 2000

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