Em questão

Censura?

 

Luiz Antônio Magalhães

O site do Observatório da Imprensa, dirigido pelo jornalista Alberto Dines, foi dispensado pelo provedor de internet Universo Online, controlado majoritariamente pelos grupos Folha e Abril. No último dia 16, Dines foi avisado por Caio Túlio Costa, diretor geral do UOL, que o contrato entre o Observatório e o provedor, válido até setembro deste ano, não será renovado.

Segundo Alberto Dines, o diretor do UOL explicou que a decisão foi tomada em função de uma mudança na estratégia do provedor, que passará a privilegiar a “monetização do conteúdo”, versão confirmada pelo próprio Caio Túlio em nota divulgada pelo site Blue Bus.

Para Dines, no entanto, a justificativa de Caio Túlio esconde as verdadeiras razões da dispensa do Observatório, uma ONG virtual criada há três anos com a missão de fiscalizar o desempenho da imprensa brasileira: “É certo que nós nunca geramos dinheiro para o UOL. Geramos visitas de leitores qualificados”, afirma Dines. De acordo com o jornalista, o rompimento tem relação direta com um artigo de sua autoria, publicado no site na edição de 5 de junho, em que analisava a venda de um percentual da Globo.com a investidores italianos e citava o fato do UOL também ser controlado parcialmente por estrangeiros, o que a legislação brasileira não permite. “Na minha avaliação, foi um ato censório”, comenta o jornalista.

Há pouco mais de um ano, Dines foi demitido da Folha de S. Paulo e se envolveu em uma polêmica com Octávio Frias Filho, diretor de redação do jornal. Na época, o embate se deu em torno da parceria da Folha com um grupo norte-americano na área gráfica, que, segundo Dines, também contrariava a legislação. Frias Filho negou violentamente tanto a parceria como a relação da demissão do jornalista com o artigo em que a parceria era analisada.

O site do Observatório da Imprensa, porém, não acaba com a dispensa do UOL. O programa de TV homônimo, veiculado na rede pública, continuará sendo transmitido normalmente. A próxima edição do site, que entra no ar no próximo dia 20, será a última hospedada no UOL (www.uol.com.br/observatorio). Já na edição do dia 5 de agosto, o Observatório muda de provedor —Dines não pôde, por razões contratuais, antecipar ao Correio o nome do novo parceiro, mas garantiu que o acordo está fechado em melhores condições do que as obtidas com o Universo Online. “Vamos crescer, aumentar nossa equipe e incrementar a relação entre o site e o programa de TV”, comemora o jornalista.

De ricos e riqueza

A revista Veja publicou na semana passada uma ampla reportagem sobre os brasileiros ricos, ou melhor, sobre aqueles que são muito, mas realmente muito ricos. Gente com rendimentos superiores a meio milhão de reais por ano. De acordo com a revista, são exatos 2745 brasileiros nesta condição, excluídos os que sonegam ou não declaram impostos.

Quem lê a reportagem rapidamente fica com a impressão de que o semanário da Editora Abril condena o comportamento da elite brasileira e critica a má distribuição de renda do país. Ledo engano. Muito bem elaborada dentro do padrão de imbecilidade vigente, a matéria tem três objetivos: mostrar como é bom ser muito rico; reforçar a ideia de que não há relação entre o enriquecimento da elite e o empobrecimento do povão; e fazer a apologia da riqueza como “vitamina da sociedade e tonificante dos valores morais”.

O primeiro objetivo é alcançado com um apanhado de depoimentos sobre gente que faz compras na loja de roupas mais cara do país —a Daslu, de São Paulo. É o mel na sopa para nossa consumista classe média, que almeja gastar com uma bolsa o equivalente a um automóvel novo. No fundo, é mesmo bom ter muito dinheiro no Brasil, até porque os poucos inconvenientes (violência, sequestros, má qualidade de vida das metrópoles etc.) são de fácil solução. Basta contratar uma penca de seguranças particulares, comprar um helicóptero para fugir do trânsito e uma ilha particular, para escapar da poluição e dos farofeiros da praias (polícia, engenharia de trânsito e planejamento do turismo, definitivamente, são coisas de pobre…).

Os outros dois objetivos permeiam toda a reportagem de Veja. “O absurdo”, diz a revista, “é haver tanta gente pobre quando é possível ser rico”. Apesar do padrão de acumulação no país possuir “muitos vícios”, continua Veja, é preciso que os brasileiros mudem de perspectiva, “porque há muitos exemplos de fortuna laboriosamente construída no Brasil.”

É evidente que a vida das elites —no Brasil e em rigorosamente todos os países capitalistas do planeta— é um mar de rosas. O que Veja fez foi mostrar algumas dessas rosas, dizer que cheiram bem e que o mundo deve se espelhar na divisão desigual do roseiral. Que Veja produza tanta bobagem, não espanta ninguém. Que mais de um milhão e meio de brasileiros continuem fiéis ao semanário, isto sim é uma questão a ser seriamente debatida por quem quer construir uma imprensa alternativa e um país radicalmente diferente.

Luiz Antônio Magalhães, é editor do Correio da Cidadania
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