comunicação Em questão Fátima de Jesus Teixeira Terceira Idade

A velhice e a tecnologia

terceiraidade

Fátima Teixeira

A poucos dias precisei encaminhar uma proposta por escrito que deveria ser recebida o mais rápido possível. Como não dispunha de aparelho de fax me dirigi a uma papelaria próxima para executar a operação. Enquanto aguardava, puxei conversa com o balconista lamentando não dispor de tal comodidade em minha residência.

O balconista minimizou minha queixa afirmando que, com a chegada do micro computador e o acesso à Internet, o aparelho de fax havia se tornado um objeto obsoleto. Projetou ainda, que num futuro próximo a papelaria, a biblioteca e outros serviços ligados ao setor serão desnecessários fazendo com que a sua própria profissão desapareça do mercado de trabalho. Disse que já está se preparando na busca de novos rumos profissionais, no intuito de permanecer inserido no mundo do trabalho.

Ele argumentava com muita naturalidade e aceitação sobre as mudanças que, segundo sua analise estão por acontecer, demonstrando estar preparado para enfrentar as adaptações exigidas e manter-se incluído no novo mercado.

A rápida conversa me fez refletir sobre a importância das pessoas, especialmente as mais velhas, desenvolverem a capacidade de entender e assimilar as constantes mudanças que vem ocorrendo na sociedade atual, resultado dos avanços da tecnologia e da informática, a fim de se inserirem no contexto social.

Segundo a última Pesquisa Nacional por Amostras de Domicílios (PNAD), de 1997, o total da população brasileira levantada em 109 mil domicílios de todo o país era de 156.128.023 habitantes. Destes, 79.688.353 eram mulheres, enquanto 76.439.645 eram homens. A população feminina com mais de 60 anos era de 7.420.388 pessoas e a de homens de 6.081.442. É exatamente esta a faixa etária que assistiu e vivenciou a grandes e interessantes transformações sociais decorrentes do progresso da ciência e da tecnologia.

Para os jovens as mudanças são sempre bem vindas, pois em geral , são mais abertos a novidades e aceitam o novo como possibilidade de realizarem outras escolhas, como bem demonstrou o balconista. Já as pessoas idosas, em geral, mostram-se mais resistentes, porque as situações desconhecidas causam-lhes inseguranças e ansiedades.

Os idosos que encontram-se hoje na faixa etária entre os 70 e 80 anos, provavelmente utilizaram água de poço, cozinharam em fogão à lenha, e à noite iluminaram as conversas na sala com a luz do lampião, isso sem considerar as mudanças no campo das relações familiares e comportamentais que merecem uma análise mais aprofundada.

Essas pessoas acompanharam a rápida evolução do mundo moderno, se adaptaram e absorveram em seu cotidiano as facilidades oferecidas pela variedade dos aparelhos eletrodomésticos. Incorporaram também a escada rolante, o metrô como meio de transporte e os caixas eletrônicos. Este último ainda com algumas ressalvas, pois utilizar o cartão magnético e se comunicar com uma máquina que nem sempre responde às nossas perguntas ainda é motivo de angustia para muitos aposentados em dia de receber os benefícios previdenciários ou efetuar algum pagamento. Tenho observado que muitos idosos ainda fazem questão da autenticação mecânica e do carimbo do banco como forma de comprovação do pagamento efetuado. Essa atitude pode ser fruto da desconfiança, traço às vezes acentuado nessa fase da vida.

Parece que superado o impacto inicial natural provocado pelo novo, há um claro movimento de abertura para conhecer, aprender e usufruir dos modernos recursos disponíveis. Evidentemente as pessoas mais velhas necessitam de um tempo maior para se adaptarem. No entanto, a vontade de aprender, a disponibilidade e a valorização do conhecimento é muito grande ajudando-as a transporem seus próprios limites.

Muito recentemente, a velhice vem sendo objeto de atenção e cuidados por parte da sociedade e embora de maneira lenta, vem estabelecendo-se uma nova relação da nossa cultura com a velhice. O envelhecimento vem sendo entendido como uma etapa na qual é possível manter a continuidade de uma vida ativa, produtiva e independente.

Na área da informática, por exemplo, já encontramos vários cursos especialmente dirigidos à pessoas da terceira idade, indicando que o segmento idoso vem se constituindo em campo de investimentos e paralelamente ganhando visibilidade social.

O impacto que o avanço da tecnologia provoca nas pessoas e como ele se manifesta pode variar de acordo com o grau de necessidade de contato com os equipamentos, ou o interesse e curiosidade pessoal. No entanto, o idoso que já passou por tantas fases de transição e acompanhou a várias mudanças na sociedade adquiriu a experiência necessária para enfrentá-las com serenidade.

A sabedoria do idoso consiste em flexibilizar-se e usufruir de todo o benefício que o progresso possa lhe oferecer para manter-se participativo e atuante na sociedade.

Resta uma pergunta:

Como será o comportamento dos jovens atuais que se utilizam dos disquetes para arquivar informações, realizar trabalhos, guardar documentos, etc, ao envelhecerem?

Provavelmente não experimentarão o romantismo de possuir a “caixa de recordações”, na qual estão guardadas as cartas, as fotografias e os objetos recebidos de pessoas queridas, todas juntas, colecionadas ao longo da vida.

A alteração na coloração, no perfume e outros sinais evidentes da passagem do tempo, concretizam e registram uma história de vida repleta de grandes e inesquecíveis emoções…

 

Fátima Teixeira é mestre em Serviço Social pela PUC/SP. 

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