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Avaliação da aprendizagem: pontos e contrapontos

Fernanda Duarte Araújo Silva

publicado em 04/11/2009

 

Resumo:


Fernanda Duarte Araújo Silva é mestre em Educação (2007) pelo Programa de Pós-Graduação da Universidade Federal de Uberlândia (UFU), especialista em Docência no Ensino Superior (UFU-2004) e graduada em Pedagogia (UFU-2003). Possui experiência na Educação Infantil e Ensino Fundamental como Docente e Coordenadora Pedagógica. Atuou como Professora Assistente da Universidade Federal do Tocantins e atualmente é Professora da Universidade Federal de Uberlândia, Campus do Pontal.
fernandaduarte@pontal.ufu.b

Discutir e analisar a avaliação significa compreender um pouco do cotidiano escolar. Nesse sentido, pretendemos contribuir de forma singela, no sentido de proporcionar reflexões, acerca do tema avaliação da aprendizagem. A partir de então, estabelecemos um diálogo com a bibliografia que trata sobre a avaliação em diversas abordagens. Consideramos que avaliar é indispensável em toda atividade humana e, portanto, em qualquer proposta de educação.

PALAVRAS-CHAVE: Avaliação, Educação, Aprendizagem, Formação de Professores.

ABSTRACT

To discuss and to analyze the evaluation means to understand a little of the daily school. In that sense, we intended to contribute in a simple way, in the sense of providing reflections, concerning the theme evaluation of the learning. Starting from then, we established a relationship with the bibliography that talks about the evaluation in several approaches. We considered that to evaluate it is indispensable in all human activity and, therefore, in any education proposal.

KEYWORDS: Evaluation, Education, Learning, Formation of Teachers.

 

 

Discutindo o conceito de avaliação…

Discutir e analisar a avaliação significa entender o que acontece na escola. É fundamental que toda comunidade escolar entenda o que é avaliar.

Nesse sentido, pretendemos contribuir, no sentido de proporcionar reflexões, acerca da realidade das escolas que geralmente trabalham com verdades absolutas, prontas e acabadas, inclusive no que diz respeito ao tema avaliação.

Assim, precisamos buscar a concretização do discurso que muitos de nós conhecemos: a avaliação deve ser contínua, de forma a verificar os vários momentos de desenvolvimento do aluno, já que a ideia é dar ênfase também a comparação do aluno com o seu próprio desenvolvimento, ao invés de apenas comparar o seu rendimento, em um dado momento, com parâmetros externos a ele.

Com base em nossa experiência profissional percebemos que, encontramos poucos educadores que consideram a avaliação como um valioso instrumento de compreensão dos avanços, limites e dificuldades que os educandos estão encontrando para atingir os objetivos do curso, disciplina ou atividade da qual estão participando.

A partir de então, estabelecemos um relacionamento com a bibliografia que fala sobre a avaliação em diversas abordagens. Assim, foi possível diagnosticar que a avaliação escolar é apresentada principalmente em duas lógicas, a compreender, por um lado a concepção de avaliação positivista (autoritária), por outro, a concepção de avaliação crítica (emancipatória) que demonstra uma prática que valoriza a história e o processo de cada educando.

Nos últimos anos, a avaliação da aprendizagem vem sendo objeto de inúmeros estudos e pesquisas. Romão (1998), Luckesi (1999), Hoffmann (1993), Vasconcellos (2000), Perrenoud (1999), dentre outros. Esses autores apresentam alguns princípios do problema como suporte de pesquisa, com vários enfoques de tratamento como o sócio-político, o filosófico, o histórico-cultural e o tecnológico, ao mesmo tempo apontam caminhos para uma avaliação dialógica, da aprendizagem, mediadora, formativa, processual e contínua como caminho para a prática avaliativa. Entretanto as práticas docentes, muitas vezes, continuam reproduzindo uma avaliação tradicional que se opõe ao campo teórico crítico emancipatório.

Segundo eles, a avaliação da aprendizagem tem como intuito identificar as carências e primazias, situando o educador e o educando no processo escolar. Nesse sentido, ela possibilita o aperfeiçoamento do ensino que vem sendo desenvolvido, deixando de ser meramente classificatória, tornando-se um trajeto capaz de levar o aluno ao aprendizado.

Para Perrenoud (1999), a avaliação da aprendizagem é um processo regulador sobre a individualidade de cada educando, apontando seus limites e possibilidades. A regulação da aprendizagem como da ação pedagógica deve possibilitar ao educador redimensionar as trajetórias a serem percorridas desembocando numa prática formativa.

Assim, se faz necessário uma mudança paradigmática entre a hierarquia de excelências para uma regulação das aprendizagens possibilitando tanto uma diferença na escolha dos conteúdos e dos métodos avaliativos como no modo de coletar e interpretar o saber para revigorar a prática pedagógica. Por isso, esse estudioso ressalta que para mudar a avaliação é necessário mudar a escola.

Conforme Romão (1998),

A Avaliação da Aprendizagem é um tipo de investigação e é, também, um processo de conscientização sobre a “cultura primeira” do educando, com suas potencialidades, seus limites, seus traços e seus ritmos específicos. Ao mesmo tempo, ela propicia ao educador a revisão de seus procedimentos e até mesmo o questionamento de sua própria maneira de analisar a ciência e encarar o mundo. Ocorre, neste caso, um processo de mútua educação. (p.101).

Percebemos que a avaliação do processo de aprendizagem e de ensino, possibilita investigar e refletir sobre a ação do aluno e do educador instigando a transformação através do contexto da sala de aula.

De acordo com Luckesi (1999), ainda vivenciamos a “pedagogia do exame” no contexto escolar. Ela é permeada por uma prática autoritária, disciplinadora e classificatória que mantêm e reproduz a sociedade hegemônica. O autor em questão defende uma avaliação da aprendizagem pautada numa perspectiva crítico-reflexiva. Para ele, a avaliação deve deixar de ser verificativa e se tornar diagnóstica e processual reorientando a prática do educador a possíveis tomadas de decisão.

Concordamos com essa posição, afinal, a avaliação só tem significado, se possuir muito claro o objetivo, de auxiliar o aluno no seu processo de aprendizagem.

Hoffmann (1993), também segue essa linha ao afirmar que a avaliação é o caminho de aprendizagem do aluno, quando possibilita ao educador tomar consciência da realidade do educando e, a partir de então, levá-lo ao aprendizado. Essa pesquisadora confirma nossa análise quando nos fala que a ação avaliativa mediadora se processa, ou melhor, se desenvolve em benefício do educando e dá-se fundamentalmente pela proximidade entre quem educa e quem é educado. Segundo ela, a avaliação, numa perspectiva não mediadora, não emancipatória reforça uma concepção autoritária da avaliação enfatizando o controle, a seleção e a premiação de uma pequena parcela dos estudantes.

A atual prática da avaliação escolar estipulou como função do ato de avaliar a classificação e não o diagnóstico, como deveria ser constitutivamente, como destaca Luckesi (1999):

Com a função classificatória, a avaliação constitui-se num instrumento estático e frenador do processo de crescimento; com a função diagnóstica, ao contrário , ela constitui-se num momento dialético do processo de avançar no desenvolvimento da ação, do crescimento para autonomia, do crescimento para a competência etc. Como diagnóstica ela será ela será um momento dialético de senso do estágio em que se está e de sua distancia em relação á perspectiva que está colocada como ponto á ser atingido á frente. Á função classificatória subtrai da prática da avaliação aquilo que é constitutivo: a obrigatoriedade da tomada de decisão quanto a ação , quando ela está avaliando uma ação (p.35).

Assim, em uma proposta de avaliação, não podemos dar ênfase somente as respostas certas ou erradas, mas também, e com relevada importância, ao como um aluno chega a tais respostas, tantos as certas quanto às erradas. Isto significa considerar que o conhecimento produzido pelo educando, num dado momento de sua experiência de vida, é um conhecimento em processo de superação. A criança o jovem, aprimoram sua forma de pensar o mundo à medida que se deparam com novas situações, novos desafios e formulam e reformulam suas hipóteses” (HOFFMANN, 1993).

Podemos afirmar que não tem sentido a escola continuar usando a avaliação, de forma escusa apenas como instrumento de classificação em detrimento de outras possibilidades mais lícitas como a do diagnóstico, por exemplo. A avaliação apenas com a função de classificar educandos, não dando ênfase ao desenvolvimento, em pouco ou em quase nada auxilia o crescimento deles na aprendizagem.

Percebemos que o modo como uma escola trabalha com avaliação é o reflexo da educação que ela valoriza. Nesse sentido, essa prática, na perspectiva de uma avaliação emancipatória, deve ser capaz de julgar o valor do aluno e possibilitar que ele cresça como indivíduo e como integrante de uma comunidade. E essencialmente a avaliação deve visar à superação da exclusão.

Avaliação da aprendizagem: algumas dimensões …

A avaliação vem sendo a nosso ver um dos grandes vilões da educação, basta ver os elevadíssimos índices de reprovação e evasão escolar ou ainda os efeitos de inculcação ideológica. Vasconcellos (2000), afirma que a inculcação ideológica é um processo que visa a conformidade dos indivíduos em seu lugar na sociedade, pelo reconhecimento de sua desvalia, de sua incompetência (com justificativas científicas, inclusive). É função da escola então, de acordo com este conceito, humilhar os menos desfavorecidos, tornando-os como fracassados escolares. Vale destacar que a educação enquanto prática social mediadora, pode ser usado como instrumento de exclusão, mas também de crítica e transformação.

Segundo o autor o problema maior da avaliação é seu uso como instrumento de discriminação e seleção social, na medida que assume, no âmbito da escola a tarefa de separar os aptos dos inaptos, os capazes dos incapazes. E cumpre a função de legitimar o sistema dominante. A escola deve desenvolver no educando instrumentos de crítica do conhecimento universal acumulado, compreendendo-o não como um conhecimento histórico que vai sendo construído, sendo ele próprio sujeito dessa construção.

Segundo Luckesi (1999), a maioria da escola desenvolve práticas de mera verificação e não propriamente de avaliação. Segundo o autor, existem diferenças entre os atos de verificar e avaliar:

O processo de verificar configura-se pela observação, obtenção, análise e síntese de dados ou informações que delimitam o objeto ou ato com o qual se está trabalhando” (p.92).

Já “ao ato de avaliar implica, em coleta, análise e síntese dos dados que configuram o objeto da avaliação, acrescido de uma atribuição de valor ou qualidade, que se processa a partir da comparação da configuração do objeto. O valor ou qualidade atribuídos ao objeto conduzem a uma tomada de posição a favor ou contra o objeto, ato ou curso de ação, a partir do valor ou qualidades atribuídos, conduz a uma decisão nova: manter o objeto como está ou atuar sobre ele.(p. 93).

Mendes (2005) destaca os pesquisadores desta temática têm sido unânimes em dizer que as práticas atuais são meramente de verificação da aprendizagem de um simples ato de aplicar provas, atribuir notas e classificar os educandos. O educador reduz a avaliação á cobrança daquilo que o aluno memorizou e usa a nota somente como instrumento de controle.

As escolas assim, se utilizam apenas de provas escritas como forma de avaliar o que foi assimilado pelos educandos no decorrer do ano. São as conhecidas semanas de provas, e que na maior parte das vezes exige a simples memorização dos educandos. Com isso percebemos um crescente desinteresse dos educandos pelo estudo. Como consequência aumentam nas escolas os casos de indisciplina; já que as crianças não veem significado e nem se sentem mobilizados com aquilo que o educador propõe. A alternativa que nós educadores encontramos diante de tal situação, é utilizar a nota como instrumento de coerção. Usamos então a avaliação para garantirmos a autoridade. Vasconcellos (2000) afirma:

Tem se, portanto, um quadro dramático: de um lado o professor cheio de boas intenções, mal preparado e com uma proposta equivocada; de outro lado, o conjunto dos alunos, que não tem consciência do que estão fazendo ali e não percebem o sentido daquilo que está acontecendo. Evidentemente, a situação é explosiva; os alunos das séries iniciais até que aceitam, mas o problema vai se complicando nas séries seguintes. O professor se vê desorientado diante de uma turma que rejeita aquilo que tem a oferecer. Reflete então: o erro não está naquilo que está oferecendo; o erro não está nele; logo, o erro só pode estar nos alunos que são desinteressados, sem base, dispersos, indisciplinados, cada vez mais mal-educados, irresponsáveis, etc (p.37).

Segundo Luckesi (1999), o educador utiliza se das provas escritas como fator negativo de motivação. O estudante deverá se dedicar aos estudos não por que os conteúdos sejam importantes, significativos e prazerosos de serem aprendidos, mas sim por que estão ameaçados por uma prova. O medo os levará a estudar. Vasconcellos (2000) afirma que:

… “O problema da avaliação é muito sério e tem raízes profundas: não é problema de uma matéria, série, curso ou escola; é de todo um sistema social determinado que impõe certos valores desumanos como o utilitarismo, o consumismo, a alienação, a marginalização, valores estes que estão incorporados em práticas sociais, cujos resultados colhemos em sala de aula, uma vez que funcionam como”, filtros “de interpretação do sentido da educação da avaliação (p. 14)”.

A avaliação que deveria ser acompanhamento do processo educacional acabou tornando-se o objetivo deste processo na prática dos educandos e da escola.

Além disso, os educandos demonstram, cotidianamente, possuírem distúrbios físicos e emocionais quando precisam fazer as provas, entre eles: mal-estar, dor de cabeça, tensão, medo, insônia,…

Assim, muitos educadores distorcem o sentido da avaliação, já que dão a ela um grande destaque, usando-a como instrumento de pressão, de controle do comportamento dos educandos.

Algumas considerações…

A avaliação escolar é hoje um grande desafio. Se a prática avaliativa deve ser considerada como um recurso metodológico de reorientação do processo ensino – aprendizagem, por que a escola monta todo um clima de tensão em cima das provas? E por que o educador precisa supervalorizar as notas para dominar a classe? Por que os educandos estão acostumados a estudarem apenas nas vésperas das provas? Como então transformar práticas meramente verificativas em práticas realmente avaliativas, que acompanhe e ajude o aluno durante o processo de aprendizagem ?

Como afirma Gadotti (1984), a avaliação é inerente e imprescindível, durante todo o processo educativo que se realize em um constante trabalho de ação-reflexão-ação, porque educar é fazer ato de sujeito, é problematizar o mundo em que vivemos para superar as contradições, comprometendo-se com esse mundo para recriá-lo constantemente.

Dessa forma, avaliar é indispensável em toda atividade humana e, portanto, em qualquer proposta de educação. E essa realidade descrita vem justificar a necessidade de continuarmos discutindo e pesquisando o tema, contribuindo de forma singela, com possíveis modificações necessárias em nossa realidade escolar.

 

REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA

HOFMFMAN, Jussara. Avaliação: Mito e Desafio: uma perspectiva construtivista. Porto Alegre , Educação e Realidade , 1993 .

GADOTTI, M. Educação e poder: introdução à pedagogia do conflito. São Paulo: Cortez, 1984.

LUCKESI, Cipriano Carlos. Avaliação da aprendizagem escolar: estudos e preposições. São Paulo: Cortez, 1999.

MENDES, O. M. Avaliação formativa no ensino superior: reflexões e alternativas possíveis. In: VEIGA, I. P. A e NAVES, M. L. P. (orgs). Currículo e avaliação na educação superior. Araraquara – SP: Junqueira & Marin, 2005, p. 175-197.

PERRENOUD, Philippe. Avaliação: da excelência a regulação das aprendizagens entre duas lógicas. Porto Alegre: Artes Médicas Sul, 1999.

VASCONCELLOS, Celso dos Santos. Avaliação; concepção dialética libertadora da avaliação escolar. São Paulo: Libertad, 2000.

*Mestre em Educação. Professora da Universidade Federal de Uberlândia, Campus do Pontal.

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